quarta-feira, 15 de maio de 2019


ENTREGA E CONFIANÇA: A LIÇÃO DO
MESTRE NO SERMÃO DA MONTANHA
 
Ana Trajano



       Aquele que é o mais conhecido, com efeito é também o mais belo dos sermões do mestre Nazaré. Nele está a síntese do pensamento  daquele que disse: "eu não vim para abolir as leis e os profetas; eu vim para aperfeiçoá-los." (Mateus, 5-17) E, de fato, Jesus aperfeiçoa-os: aproxima Deus do homem,  acaba com a figura de um Deus sisudo e distante que apenas castiga, para nos fazer crer num Pai que é pura misericórdia, numa relação de tanta intimidade e tanto amor que se assemelha à nossa com o nosso pai terreno - só que em tudo perfeita. "Quem dentre vós dará uma pedra a seu filho, se este lhe pedir pão? E se lhe pedir peixe dar-lhe-á uma serpente? Se vós, pois, que sois maus, sabeis dar boas coisas a vossos filhos, quanto mais o vosso Pai celeste dará boas coisas aos que lhe pedirem." (Mateus, 7-9)
        Todo o Sermão  da Montanha é perpassado por uma única realidade: a humanidade e Deus, isto é, o Pai e seus filhos, e o cuidado do Pai para que seus filhos e filhas ajam de forma correta para uma perfeita harmonia com o criador e a criação. Neste sentido, podemos dizer que o Sermão da Montanha sustenta-se em três pilares: humildade, entrega e confiança, que tornam possível nosso bom relacionamento com o Pai. Que relacionamento - eu pergunto - pode crescer e dar frutos sem que essa tríade esteja presente?
        As bem-aventuranças expressam o cuidado desse Pai misericordioso para com os seus filhos, de quem nada lhe passa despercebido, nem a fome, nem a sede, nem as injustiças, nem as perseguições, nem uma lágrima do nosso pranto. Se é assim, basta apenas que nos entreguemos e confiemos. O Pai que está oculto, mas tudo vê, cuida de nós. Por que, então, a preocupação com o que comer e o que vestir? O Pai que alimenta os pássaros e veste as plantas não nos desamparará. (Mateus, 6-25 a 30).
        Nesse entendimento do amor puro e incondicional, o Pai confunde-se com os filhos, quer ser visto em cada um de nós. Seu amor nos é dado com a mesma medida com que amamos os nossos irmãos; sua misericórdia nos é concedida na mesma proporção que a concedemos ao outro, e seu perdão também. Nossas ações são a medida da  justiça divina. Isto está bem claro na oração do Pai Nosso: "...Perdoai as nossas ofensas, assim como perdoamos a quem nos tem ofendido..." Isto é Jesus, ensina-nos a pedir, que as nossas ofensas sejam perdoadas na mesma proporção com que perdoamos as dos nossos irmãos.
        Para revelar esse Deus-amor, o Sermão da Montanha rompe velhos paradigmas, conceitos, pensares das leis judaicas, como por exemplo o "dente por dente, olho por olho", e "amarás o teu próximo e poderás odiar teu inimigo." O mestre ensina que deve ser o contrário. De fato, como mudar uma situação com outra idêntica?
        Ao afirmar que não veio para abolir os mandamentos, mas aperfeiçoá-los, Jesus nos mostra que eles são essenciais; porém a sabedoria não está apenas em cumpri-los; o mais importante é a transformação interior que elimine a prática dos erros em sua raiz. Dessa forma, não basta apenas não adulterar, mas destruir em si o desejo que leva ao adultério.(...todo aquele que lançar um olhar de cobiça para uma mulher, já adulterou com ela em seu coração) (Mateus, 5-27).
        Para Jesus, o mal está no desejo e a salvação em controlá-lo; está, pois, no controle dos sentidos. Damos aqui como exemplo o episódio bíblico de Adão e Eva. O que levou os nossos primeiros pais a serem expulsos do paraíso senão o desejo de provar do proibido, senão sua atração pela matéria? O mundo sensorial relaciona-se com o mundo da matéria, com todas as suas tentações.
        E prossegue Jesus: "Se teu olho direito é para ti causa de queda, arranca-o e lança-o longe de ti, porque é preferível perder um só dos teus membros a que todo o teu corpo seja lançado na geena." Mateus, 5-29) Não é do olho  que Jesus está falando; mas do que o olho viu e desejou, do que se vê com cobiça, mesmo sabendo que o cobiçado não é correto. É o desejo que deve ser lançado fora. Melhor controlar os sentidos, do que perder o controle deles e cair em perdição. A geena bem pode ser entendida como o fogo da consciência a destruir-nos por inteiro.


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